sai pedra, entra espaço

Manhã de domingo. No segundo andar do Sesc Belenzinho uma sala de vidro. Auana Diniz e Elisa Matos, amigas, pesquisadoras e sócias da Colchete Projetos Culturais, terminam de organizar os últimos ajustes para o início da oficina [espaço-papel-tesoura]. Futons pretos dispostos no chão lado a lado em retângulo. Ao fundo, sobre uma grande mesa, papéis coloridos de tamanhos diversos. Próximo do vidro barbantes deslizam do teto.
Eric Magalhães Leal, de 11 anos, e sua mãe, a funcionária pública Silvia Cristina Magalhães, são os primeiros a chegar. Moradores do bairro São Mateus e em visita ao Sesc Belenzinho pela primeira vez não imaginavam que haviam atividades para pais e filhos gratuitamente. Eric e Silvia resolvem participar. Outras pessoas entre adultos e crianças também tomam o espaço. Elisa fala sobre o nome da oficina que faz referência a brincadeira pedra, o papel e a tesoura, também conhecida como joquempô. Ela propõe a oficina como um jogo, convidando os participantes para pensar o espaço e o desenho utilizando basicamente papel, tesoura e cola..
Auana e Elisa distribuem folhas grandes de papéis verde escuro para todos. Pais e filhos, cada um ganha o seu. E logo depois, outra leva de papéis menores, em cor laranja, com formatos geométricos diversos. “Se insiro um retângulo, crio um outro espaço nele! Se insiro um triângulo sem deixar passar o espaço, é outra coisa”, diz Auana.
A proposta que recebemos é de utilizar esses papéis para desenhar o que quisermos. “A regra é que não se pode deixar nenhum pedaço do papel de fora. Tem que usar todo o papel”, avisa Auana. Formas vão se fazendo entre tesouras e colas. Para Raimundo da Silva Santos, de 33 anos, a oficina propôs algo que ele nunca imaginou. “É só papel, tesoura e uma cola. Qualquer um pode fazer”.
Os desenhos foram recolhidos e colados no vidro da sala. Ao observar a disposição dos trabalhos, podíamos ver o outro lado, as pessoas passando, a vida no Sesc. Eric fez uma tartaruga com sobreposições de papel. Para Raimundo parecia uma mesa, para outros parecia um caminhão. Ficamos divagando sobre o que víamos e como víamos em cada desenho. Silvia, a mãe de Eric, desenhou uma paisagem de férias. Imaginou um lugar para viajar e fez um Sol com os restos de papel da janela. Auana lembrou que em casa nós abrimos a janela para ver a luz, curiosamente no desenho de Silvia isso também aconteceu. A janela deu espaço para o Sol. Já Raimundo, lembrou da infância no interior e também fez um desenho de paisagem com casas e igreja.
A oficina continuou com o desafio de escolher um papel da cor que cada um quisesse e, a partir da dobra, esculpir o papel. A proposta foi para que os papéis ganhassem formato tridimensional. Surgiram formas que remetiam a barcos, lonas de circo, naves espaciais... Os trabalhos foram se concretizando e após cada um terminar sua escultura, elas foram penduradas nos barbantes que deslizavam do teto. Uma pequena exposição temporária pode ser observada por todos pelo lado de dentro e fora da sala.
Para Eric a experiência da oficina foi marcante. “Em geral eu não tenho o hábito de desenhar ou fazer nada assim, eu fico mais em casa jogando videogame porque moro em um lugar deserto e lá não há muitas crianças. Foi ótimo poder fazer outras coisas, pensar no papel de outra maneira”. Sua mãe, Silvia, que participou da oficina mais por insistência do filho, disse que adorou a experiência e que pretendia voltar. E voltaram. Logo após o almoço, na oficina da tarde [e se a gente começasse com uma pergunta?] eles estavam lá para mais uma experimentação.
Foto: Sofia Colucci